Fugindo do Controle

Ultimamente tenho pensado muito sobre uma palavrinha que ouvimos bastante nos dias de hoje: controle.
Devemos ter controle sobre o que comemos, devemos ter controle sobre as nossas emoções, devemos ter controle sobre o nosso dinheiro e controle sobre o nosso tempo. Não importa qual a área da vida que a gente vá ler um texto ou ouvir uma palestra, sempre vai ter alguém que vai nos ensinar a controlar um pouco melhor…

Sinceramente, quando penso nisso o que eu penso é em medo, prisão e sofrimento, pois controle na vida não é uma coisa que se sustenta. A vida muda todos os dias e o controle tem os dias contados! E a verdade é que quando ele é quebrado por algum motivo, na maioria das vezes o que acaba chegando, destruindo tudo o que vê pela frente é um descontrole total — parando pra procurar sobre o assunto é bem comum ouvirmos relatos de pessoas que passaram de um extremo ao outro.

Um dos exemplos que podemos ver por todos os lados na mídia é com relação a alimentação. As pessoas falam muito sobre magreza, corpo perfeito e dietas… Por mais que hoje em dia existam profissionais maravilhosos que falem sobre ouvir o nosso corpo e comer de maneira equilibrada, o que mais acaba aparecendo na mídia e sendo motivo de matérias são os extremos: alimentos vilões, jejum, pouco carboidrato, artista X ou artista Y que tiveram acompanhamento de uma “profissional” por tantos dias e eles conseguiram perder não sei quantos quilos, outra artista que fala sobre ter encontrado prazer na restrição alimentar e que quando sentia vontade de comer algo “fora da dieta” procurava fotos dela mesma gorda para se “incentivar”.

Me responda com sinceridade, será que daqui 1 mês, 6 meses, 1 ano essas pessoas vão conseguir seguir por esse caminho ou enfrentarão um efeito sanfona, episódios de compulsão e momentos de sofrimento por “saírem” desse controle?

Recentemente assisti um episódio de um programa chamado “Adam’s ruins everything” (ou em português: Adam arruína tudo) em que ele aborda diversos assuntos e com a orientação de especialistas e pesquisas, apresenta dados que derrubam mitos sobre alguns assuntos. O episódio que eu vi nesse dia falava sobre os mitos das dietas e da perda de peso. E o que não foi surpresa nenhuma pra mim, ele apresentou que os participantes de programas como “O grande perdedor” em sua grande maioria, cerca de 90%, recuperaram o peso perdido. E assim podemos seguir com relação as estatísticas de quem faz dietas drásticas e até mesmo cirurgias com o objetivo de emagrecer.

E aí você deve estar se perguntando o porquê de eu estar falando nisso… Porque quando paramos pra pensar nos nossos comportamentos do cotidiano, eles normalmente são sinais de alertas para sentimentos que estamos deixando passar batido, que não estamos tendo tempo para entrar em contato ou que não conseguimos entrar em contato.

Nossos sentimentos precisam ser nomeados, nossas emoções precisam ser vividas, nossos medos precisam ser explorados e caso isso não ocorra em nossa vida o que acaba aparecendo — pois eles precisam “se mostrar” de alguma forma — são os sintomas.

Comer muito é um sintoma, assim como comer muito pouco ou se controlar tudo o que se come. Muitas vezes o problema que acabou sendo mascarado pelo excesso da comida, acaba sendo mascarado pelo excesso de controle. E tanto em um excesso, quanto em outro, dificilmente a pessoa parou para olhar para si, para os seus sentimentos, e tentar entender do que se trata o querer controlar ou se descontrolar ao extremo. Ao contrário, ela acaba direcionando a energia dela para controlar, algo “controlável” (no caso, a comida) já que as emoções e os sentimentos, são intocáveis e não é possível controlar.

E aí você me pergunta, tá mais e aí?

Pois bem, a palavra chave é acolhimento. E vejo que quando falamos de controle em nossa vida, auto acolhimento e o amor próprio passam longe — há quilômetros de distância! Porque ao meu ver, onde há muita rigidez, não há espaço para se entender o que está por trás da necessidade de controle, não há espaço para acolher a nossa humanidade, não há espaço para acolher que a vida não é uma linha reta, mas algo que muda todos os dias.

Arrisco dizer que na grande maioria das vezes onde se há uma necessidade de controle muito grande, esse controle está sendo usado para tapar algum buraco muito mais profundo.

A vida é feita de altos e baixos, existem dias bons e existem dias não tão bons, existem dias quem tudo sai como o planejado e existem outros dias que nem tanto.

Quando penso em saúde mental não consigo pensar que seja algo em que a pessoa consiga ter controle de tudo, seguir um plano nos mínimos detalhes e chegar a um ideal. Até por que, quando falamos em ideal, de que ideal estamos falando?!

Saúde mental é poder se adaptar as mudanças da vida, aos imprevistos, é passar pelos problemas e conseguir se levantar, é saber que por mais que as coisas não estejam sob controle não há problema nenhum nisso, pois podemos nos reinventar a partir das novas possibilidades.

E quando falamos de alimentação, dietas e magreza, paro pra pensar: será que estamos podendo nos ouvir? Quando se come demais, se come sentimentos, se come as preocupações, se está tentando encher não só a barriga, mas uma ferida, uma tristeza ou uma preocupação que nos dá um vazio?

E quando se come de menos? Quando se controla cada grama de alimento, será que queremos controlar na realidade o nosso exterior que temos a impressão que está saindo do controle? Nossas relações que estão ou algum dia foram complicadas? Estamos buscando um ideal que acreditamos ser o único possível?

Através do auto conhecimento é possível chegar a um outro ponto da vida, é possível nomear sentimentos, é possível olhar para as situações da vida, é possível entender as nossas feridas mais profundas. Freud dizia que a “psicanálise é a cura pela palavra” e isso é algo que eu acredito demais!

Quando podemos entrar em contato com nós mesmos a vida flui de uma maneira diferente, conseguimos desconstruir ideais e entender o porquê de certas ideias, medos e pensamentos. Podemos entrar em contato com aflições que estão presentes e que por não entrarmos em contato, elas não deixam de existir, mas elas aparecem do jeito que conseguem para nos dar sinais de que precisamos parar e nos escutar.

Então, eu te convido a parar e pensar sobre a sua vida. O que você tem feito com seus sentimentos e experiências ruins? Você os olha ou os deixa de canto e eles tem aparecido de outras formas na sua vida? Cuide da sua mente, das suas emoções! Estando saudável no seu interior, a consequência é estar saudável na
outras áreas também .

Julia Lainetti é psicóloga e membra do Grupo de Estudos #VcTemFomeDeQuê?

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *